Oi, Valéria!
Estou muito gratificada por você haver me incluído no Projeto Dança Contemporânea a Domicílio. Foi uma entrega... de corpo e alma! Maravilhosa a apresentação da Cláudia Müller, que traz, além da linguagem corporal, uma fala bastante forte e real sobre a imagem que ainda se faz dos profissionais da Arte. Essa "falsa missão sacerdotal" também invade o campo dos trabalhadores da Educação.Convidei um casal de amigos jovens que trabalham no IFRJ e que valorizam a Arte. Eles também ficaram encantados com a apresentação.
Desejo realmente muito sucesso para que a Dança Contemporânea chegue a vários domicílios, como escolas, espaços culturais, hospitais, lares de pessoas idosas e, principalmente, em comunidades onde espetáculos culturais não circulam mas onde existe um imenso potencial de criação, ignorado pelas políticas públicas da nossa cidade, do nosso estado e... do nosso Brasil!
Obrigada e parabéns pela sua participação no Projeto! Meu reconhecimento ao trabalho silencioso no domicílio, mas bastante eloquente no site, realizado por Carlinhos Santos.
Um carinhoso abraço, Dilza
sexta-feira, 2 de novembro de 2012
Registros da temporada
Valéria Valenzuela, codiretora do vídeo Fora de Campo com Cláudia Müller, presenteou uma amiga com uma entrega de Dança Contemporânea a Domicílio. Depois de receber a dança em suia casa, na Tijuca, Dilza escreveu a Valéria:
quinta-feira, 1 de novembro de 2012
Entre instâncias, reorganizando olhares
Entre divisórias, entre corpos, entre olhares, instigando pensamentos, modificcando ambientes, acionando reflexões, eis o corpo que dança em domicílio. Mais um registro de Inês Correa.
Um registro em curso
As
entregas do Dança Contemporânea em Domicílio terminaram terça-feira. Mas existem
outros desdobramentos. Além das entregas, o projeto Uma Coreografia de Relações,
desenvolvido com recursos do FADA 2012, Fundo de
Apoio à Dança, da Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro prevê a
publicação de um livro, no primeiro semestre de 2013.
Nele serão reunidos
imagens e relatos das entregas e exbibição do vídeo Fora de Campo por 15
bairros do Rio, além de textos produzidos em torno desse trabalho de Cláudia
Müller que percorre festivais e cidades do mundo há sete anos. No livro, serão
reproduzidos escritos de Christiane Galdino, Christine Greiner, Ivana Menna
Barreto, Isabel de Naverán e Carlinhos Santos.
O material fotográfico terá registros da temporada carioca,
assinados por Inês Correa. Além de imagens da fotógrafa paulista expert em
fotografia de dança, o livro trará imagens feitas por Löis Lancaster, Nelson
Falcão, Theo Dubeaux, Maurício Concatto, Frank, Laura Corrales, Selma Santiago, Maria José Maryaneque
e Cristina Espírito Santo.quarta-feira, 31 de outubro de 2012
Abraços por relações que reverberem
Os abraços selam o prazer dos encontros, produzem sorrisos, embalam emoções. Quando se dança, quando se escreve, quando se recebe, quando se dá, quando se produz uma imagem: sempre Uma Coreografia de Relações.
Bater em portas, acionar compreensões
Lá vai o corpo contemporâneo abrir portas, lá
vai a dança, acionar compreensões, sensações, entendimentos. Cada qual circunstanciado
por repertórios próprios, de forma a elaborar novas instâncias de
entendimentos, novos olhares para a arte.
Assim, bate-se à porta da professora
de inglês Sueli de Lacerda Santos, que assiste e elogia a criatividade da
ideia. Mas ela vai além em sua opinião, tocando numa questão bem específica:
“O foco, o olho dela vai para
coisas que muitos não estão nem aí.”
Numa sala do HemoRio, assistente
de desenvolvimento organizacional e bailarina Marisa Mendes reúne uma turma de
alunos num treinamento que, dentre outras coisas, fala sobre consciência
corporal. Então, uma dança adentra à sala, surpreende o cotidiano dos alunos.
A analista de sistemas Luna Ribeiro falou:
“É muito simples, dá um recado
surreal com muito pouco. Gosto disso, do que faz as pessoas pensarem.”
O estudante de jornalismo
Philippe Matta analisou:
“É simples, rápido, mas dá outro
ar ao ambiente.”
Noutra sala de executivos que
recebeu Dança Contemporânea em Domicílio entre mesas e divisórias, os olhares
novamente foram tomados.
O funcionário Marco Aurélio couto
disse:
“É um trabalho bem apanhado,
reflexivo, trazendo motivação do que o corpo pode fazer as informações que pode
trazer para outros projetos de qualidade.”
Mais uma parada, novo ambiente de
escrivaninhas, computadores e tal. Nova impressão.
Desta vez de Patrick Mendes.
“É uma expressão em que, tanto o
corpo quanto a palavra, criam um movimento que faz com que a gente não sinta
falta da música, que é recorrente junto com a dança. É a expressão do corpo o
que mais importa.”
terça-feira, 30 de outubro de 2012
Pegadas de passos: vetores da dança
Pegadas e passos, olhares de estranhamentos, ângulos e enquadramentos dançam na coreografia do inusual, do que surpreende, do que indaga e do que instiga. Uma caminho, muitas possibilidades de percurso e lugares no foco de Inês Correa.
Tudo é palco para Dança Contemporânea em Domicílio
Você é um artista. Você tem uma
entrega de dança para fazer. Você encontra a pessoa que vai receber sonada, com
cara de “o que é isso”. Então você acorda seu público, explica a proposta, você
detalha os procedimentos, e o recebedor topa. Então ele diz pra você dançar ali, no
corredor estreito de um prédio da Praia de Botafogo, às 10h da manhã de sábado.
Desperto, o venezuelano Leonardo Rodriguez, 34, vendedor, que está há duas
semanas no Rio, festeja o presente enviado por uma amiga.
“Fui surpreendido, gostei de como
se explicita o que o artista faz, por que faz. Foi uma ótima maneira de começar
o dia”, desse Rodriguez.
Na casa da terapeuta corporal
Katia Amaral, entrega no início da tarde, muitas indagações sobre o projeto,
muitas questões partilhadas.
“É para fazer pensar sobre tudo, engloba
todos os conceitos, inclusive a necessidade da arte como alimento, como feijão
e arroz. A necessidade de criar também é nutridora. Isso certamente é novo e,
em alguns lugares, alguns se sentem incomodados.”
No Arpoador, na praia, no calor
de mais de 35 graus, na metade da tarde. Na maratona do projeto Dança Contemporânea
em Domicílio, Cláudia Müller entrega mais uma dança. Desta vez o público era a
coreógrafa Ivana Barreto e a estudante de cinema Julia Menna Barreto.
“O que me atrai no trabalho é sua
condição de deslocamento, a mobilidade que ele tem, sua capacidade de acontecer
em pouco tempo, mas que faz uma diferença muito grande no meu dia. Aqui, a questão
do tempo é importante. O trabalho acontece em pouco tempo, mas não passa rápido”,
disse Ivana.
Julia tinha informações sobre o
projeto, mas nunca assistira ao trabalho.
“Tem uma coisa que gosto muito
que é a não necessidade de um espaço físico convencional, dele se apresentado
em qualquer lugar. É bacana que ele prenda aos espaços fechados, que ele quebre
regras e convenções.”
segunda-feira, 29 de outubro de 2012
Trânsito e trâmites da arte contemporânea
Falando em vocabulários,
instâncias e inferências sobre e para a dança contemporânea brasileira, a
imagem sugere uma nova visita, num espaço de muitos trâmites, quiçá também com
trânsito para a arte contemporânea e suas vertentes. Mais um clic de Inês
Correa.
Imagens para novos vocabulários (2)
Diante de Dançarinas Subindo a
Escada, do impressionista Degas, exposta no CCBB/Rio, a professora de séries
iniciais conversa com a amiga: “esta foi a primeira imagem que veio no
Google... eu estava procurando imagens para a aula sobre dança”. Aí ela argumentou,
ainda com a amiga, que, afinal, a ideia de bailarina é sempre o que surge na
cabeça dos pequenos quando se fala de dança. Poder assim, pode ser assado.
Interpelei a menina, numa
conversa rápida, falando que ela poderia usar aquela e outras imagens,
acrescendo a palavra “contemporânea” à pesquisa no portal. Certamente a
diversidade de imagens e possibilidades para conversa com seus alunos seria
outra, mais instigante e, na opinião que não manifestei lá, mas faço aqui,
muito mais rica.
Aí volto para a entrega de dança
feita para crianças de uma aula de teatro na Arena Cultural da Pavuna, semana
passada. Muitas daquelas crianças nunca tinham assistido a um trabalho de
dança. De qualquer tipo. Daí a potência desse encontro com uma das formas de se
dançar na contemporaneidade.
Assim que a entrega terminou, as
perguntas se sucederam:
“Ô, tia, só você dança isso?”
“Tia, foi você que criou os passos?”
“Tia, quando você vai aos
lugares, é só no Rio de Janeiro?”
“Tia, você só faz dança ou também
faz teatro?”
“Tia eu faço balé, mas ainda não
dancei com sapatilha de ponta.”
Todas as perguntas apontam para
questões relevantes e fundamentais na formação de público, na educação do
gosto, na dinamização dos repertórios, com vetores que enriquecem a produção
contemporânea hoje. As respostas são pontuais, devidamente circunstanciadas.
Mas a experiência e a conversa destas crianças com um bailarino que os visitou,
o olhar para algo novo em seu imaginário, e, principalmente, a possibilidade de
perguntar são, dados pra lá de significativos dessa empreitada do Dança
Contemporânea em Domicílio.
domingo, 28 de outubro de 2012
Imagens para novos vocabulários (1)
Acima, a obra Dançarinas subindo a escada, de Degas, que integra a exposição dos impressionistas, no CCBB, Rio.
Abaixo, Cláudia Müller numa entrega de dança para crianças de uma aula de teatro, na Arena Cultural Jovelina Pérola Negra, na Pavuna.
Por ora, apenas as duas imagens postadas, para atiçar a imaginação. No próximo post, algumas considerações sobre o movimento, os estereótipos, os tipos de dança e os repertórios possíveis de construção junto ao futuro público para a dança.
sábado, 27 de outubro de 2012
Das janelas, dos olhares, das conversas
O que pede o olhar, como responde
o corpo, quantas frestas se abrem para as conversas sobre as possibilidades de
comunicar com a dança? A imagem de Inês Correa feita na Lapa instiga esse diálogo.
Enquadramentos, focos, olhares
A ideia do corpo que
dialoga com o ambiente, responde a ele e faz desse entorno o material de
elaborações de sua própria dança, emerge nas diversas situações experimentadas
durante as entregas do Dança Contemporânea em Domicílio.
Também a questão da linguagem, que só se efetiva a partir do olhar do outro, quando, enfim, o diálogo se circunstancia. São fragmentos de percepções para aquilo que se tem experimentado ao tocar a campainha de casas e apartamentos, ao se chegar a lojas ou restaurantes, ao adentar a uma das tantas escolas públicas municipais do Rio com suas grades, cadeados e segurança reforçada.
Nas entregas de sexta-feira, surpresa total para a professora de yoga Erica Humper, em Laranjeiras. Erica destacou a espontaneidade da performance, além da construção de um olhar específico para a arte e a dança. E, ainda especialmente, o caráter questionador da obra em relação às frágeis condições para se produzir arte no Brasil:
“Tem que defender isso mesmo, pois, nesse país, é complicada a situação de quem trabalha com arte.”
Nesse trânsito e, em trânsito, segue a dança para a Glória, numa entrega a integrante da Projetéis – Cooperativa Carioca de Produção Cultural. A apresentação foi um momento inaugural para o caseiro Alexander Nascimento, 35.
“Nunca tinha assistido a alguma coisa assim. É algo maravilhoso, que mostra a capacidade do ser humano.”
A produtora Talita Caetano, 26, destacou o caráter de acessibilidade à dança contemporânea proporcionado pelo projeto.
“É completamente diferente essa possibilidade de se ter isso em casa. A acessibilidade é tal, que não há nada parecido. Ir à Pavuna, Bangu e tantos outros espaços é especial.”
Na casa da atriz e diretora Juliana Tolentino, mais identificações, mais encontros estéticos.
“É bom receber sensibilidade em casa. Estou para sair e saio para a rua muito tocada. E essa questão da produção de arte, da circulação, é permanente e deve sempre ser tocada.”
Na casa da atriz e produtora Rejane Zilles, que estava acompanhada da psicanalista Juliana Torres, a entrega gerou conversas animadas, debates.
“A ideia é genial, me tocou profundamente esse discurso sobre a arte, que sempre foi e será um lampejo, uma centelha, um disparador de muitas outras questões”, disse Juliana.
Para Rejane, a ação artística do Dança Contemporânea em Domicílio é mobilizadora:
“Como artista, o trabalho me tocou muito, deu um arrepio, é muito corajoso. Além disso, o formato é muito importante, pois aciona essa questão da democratização da dança, que tem mais dificuldade de chegar ao espectador do que o cinema ou o teatro, por exemplo. E o projeto é importante para mostrar o que é dança contemporânea algumas de suas propostas.”
sexta-feira, 26 de outubro de 2012
Contaminações possíveis da dança
O olhar que recebe, o corpo que anuncia, a vitalidade das ações artísticas, a eficiência dos encontros, as reverberações produzidas. Quantos e quais vetores dão gás à dança contemporânea brasileira?
O presente na casa dos Fragoso Costa
A tarde de quinta terminou com a
família Fragoso Costa reunida na sala para receber uma Dança Contemporânea em
Domicílio. Finda a apresentação, festejou-se mais do que a mesa coberta com
delícias para o lanche da tarde. Foi um congraçamento entre adultos,
adolescente e crianças.
“É um presente, uma entrega de
carinho feita com muita leveza, transmitindo muita emoção”, disse Rosa Maria
Costa.
“Legal”, sintetizou o pequeno
Dudu.
“Foi um manifesto que mexeu
comigo, uma capacidade de dizer isso em sintonia com os movimentos”, falou
Fernando Motta, arboricultor.
Na esquina da performance com a arte militante
Numa esquina, na rua, na frente
do café, em Laranjeiras. Na plateia, seis adultos, uma menininha e dois
porteiros do prédio ao lado, que espiavam de pescoço alongado a performance de
Claudia Müller. No inusitado do fim da tarde de quinta-feira, na paisagem possível,
a interferência da arte, a contingência da aproximação de ideias e conceitos
sobre o fazer artístico:
“A dança contemporânea aparece
ali, em meio a outras coisas, da performance, do jardim. Nunca pensei
exatamente no que seja arte, mas sim no prazer estético que algo me proporciona
e, por extensão, me parece que seja arte”, disse Antonio Kevstenetzky, 20,
estudante.
“Não conhecia o texto, que é
militante em relação à arte em geral e à dança. É um trabalho que te tira do
óbvio e te faz refletir sobre o tema”, disse a professora Lilian Koifman, 45.
Enquadramentos para arte e dança
Ateliê de consertos, oficina de
customização, remendos, reparos. Espaço também para performance artística em
Laranjeiras. A atendente e bailarina Katia Rocha, 22, ficou mobilizada pela
dança ali entregue:
“Aproxima a cultura das pessoas e
amplia o conceito de arte e de dança, que atualmente é um pouco limitado.”
O lugar do produtor, o lugar da arte
Artistas por vocação X artistas
por profissão. Um embate quase fictício. Afinal, arte exige um sistema de produção
e a imersão dos que a fazem numa série de estruturas. Talvez por isso quando um
produtor cultural recebe uma Dança Contemporânea Em Domicílio fique tão
mobilizado com algumas das questões que a proposta contempla. Quinta-feira à
tarde, na Rua da Glória, um escritório de produção mobilizou-se em torno da
entrega e da conversa que essa dança gera. A produtora Lu Araújo disse que
parecia um discurso encomendado para ela.
“É o meu texto, as coisas que
vivo. Querem me fazer chorar”.
A declaração teve eco na opinião
da também produtora Simone Oliveira:
“(O trabalho) questiona o lugar
da arte.”
Falas do corpo
No plano inclinado do Outeiro da
Glória em movimento, num vértice do cotidiano carioca, o ascensorista Maxwell
dos Santos, 63, assistiu ao trabalho de Cláudia Müller. Fico feliz com a chance.
Contou que estava de olho no projeto desde que sabia da circulação em seu
bairro, a Pavuna. Afirmou que consome arte desde que os tempos da “guerra de
poesia” do rock, com a MPB. E deu sua sentença à proposta:
“A pessoa quer falar
com o corpo.”
"Uma imersão da palavra e da arte em nossa vida"
“É um trabalho genial, uma
intervenção política e poética preciosa. Estou emocionada com a força do corpo
em movimento e da palavra, que põe em xeque o sistema de trabalho do mundo e o
empobrecimento da vida ancorada num sistema que dá visibilidade ao capital.
Aproveitando essa ideia do delivery, que é do capital, entrega-se uma mercadoria que subverte
esse sistema para inventar um novo sistema que conclame a vida. E com ironia,
que funde emoção e riso, o que é muito bom. Trata-se de uma pílula de força, de
um trabalho com movimento, uma imersão da palavra e da arte em nossa vida.”
Maria Cristina Franco Ferraz,
professora da UFF e titular da ECO/UFRJ, que assistiu a uma entrega quinta-feira à tarde, durante uma aula de pilates, em Laranjeiras.
quinta-feira, 25 de outubro de 2012
Que fazer?
O texto que segue é do escritor Leonardo Marona, que recebeu uma entrega quarta-feira à tarde, ali na Travessa do Ouvidor. Tão especial quando belezas e botas!
"Entes pequenos, o que lhes falta para compreender? Ora, sabem os senhores,
sabem que sem o inglês a humanidade ainda pode viver, sem a Alemanha pode, sem o
homem russo é possível demais, sem a ciência pode, sem o pão pode, só não pode
sem a beleza, porque nada mais restaria a fazer no mundo! Todo segredo está aí,
toda toda a história está aí! A própria ciência não sobreviveria um minuto sem a
beleza (...), ela se converteria em banalidade, não inventaria um prego!" (Os
Demônios, Fiódor Dostoievski)
Talvez a última grande questão dos últimos dois séculos tenha sido: o que
vale mais, Shakespeare ou um par de botas? É um questionamento que nos joga de
cara numa parede sólida de dúvidas e contradições. Uma vez também disseram: "sem
Pushkin pode-se passar, sem botas, não há como". O problema, me parece, é que os
que estão famintos (nos mais múltiplos sentidos) não sabem o que fazer, enquanto
que os que sabem o que fazer estão gordos (geralmente, em poucos, mas
catastróficos sentidos) e bem alimentados, portanto não se mexem.
É plausível que alguém esteja agora pensando: "Mas que diabo isso tem a ver
com dança contemporânea?" Posso responder, tudo, mas quase nada. Explico-me:
Ontem, no meio do trabalho, recebi um presente. Não era uma gravata, uma
caixa de bombom, não era, como dizer, um presente comum, comumente mortificante,
que recebemos cotidianamente e que nos lembram que a vida é comum o tempo todo e
que vamos morrer. Porque, por melhor que seja receber uma gravata ou mesmo uma
caixa de bombom, isso, no fim das contas, te lembra que tu vais morrer. Bom, o
presente foi uma peça de dança no meio de oitenta mil livros, no meio do público
de uma livraria, e para mim especialmente. E, acima de tudo isso, ou seja, acima
da beleza disso, há na minha frente alguém que dança para mim e ao mesmo tempo
me explica politicamente a batalha de quem está na minha frente dançando para
mim. Nisso, voltamos duplamente à primeira questão: da beleza e das botas.
Precisamos comer, usar botas, mesmo um artista (sic), mas acima de tudo um
artista, que é quem nos traz a beleza que torna possível suportar o mundo, este,
mais do que qualquer outro, precisa comer, usar botas.
Ontem voltei e repousei feito uma pluma sobre a velha questão. Não resolvi a
questão, como jamais talvez alguém resolverá. Mas pude ver o problema dentro
dele, agraciado por ele de uma certa forma, porque era a arte que me falava.
Ligue e receba uma dança em casa!
Hoje é dia de entregas do Dança Contemporânea em Domicílio na Glória, Laranjeiras, Catete e Cosme Velho. Ainda existem horários disponíveis. Quer entregar uma dança para alguém? Ligue: 93007896! É grátis!
Portas para a dança
Qual o lugar da dança, quantos espaços tem o artista para atuar, em que porta bater? (A foto é de Inês Corrêa - clique em cima para vê-la maior)
Janelas, olhares, estranhamentos, repertórios
Desafios, encontros, olhares e
estranhamentos numa quarta-feira intensa, perambulando pelo Centro do Rio. Numa
agência de crédito, primeiro foi necessário explicar tudo direitinho para o gerente,
que se preocupava com “o que aconteceria depois” ou “a finalidade disso”. Topada
a ideia, ele e outras cinco funcionárias aplaudiram a apresentação.
Uma imbricada subida de escadas
nos levou ao “alto lapa, baixo Santa”, como denominam o lugar alguns artistas e
arte-educadores que vivem numa espécie de vizinhança de gostos, vontades e
atuação. Ali, olhares atentos, alguns das janelas, numa significativa metáfora
sobre frestas possíveis para a atuação do artista. Tanto aquele que, em
determinada ocasião, vira público, quanto o que está ali, dançando no quintal,
debaixo de uma aroeira.
“Fica o meu agradecimento ao
artista que bem na minha casa lembrar que meu desejo é fazer arte. Não uma arte
mercenária, que só pense em vender valores com os quais eu não compactuo. A
ideia mostra que às vezes as pessoas podem fazer um gesto de gratidão através
da arte”, disse Vanessa Lobo, 34, que é contadora de histórias e terapeuta.
Fabiano Manhães, 31,
arte-educador, incluiu-se num das tantas questões abordadas pelo Dança em Domicílio.
“O mais bonito de tudo é ser surpreendido
por algo inesperado, que é a arte, e pela questão que é a dicotomia da
sobrevivência fazendo arte, essa questão do dinheiro versus a arte.”
Seguimos para a sede de um grupo
de teatro na Lapa e, incrivelmente, fomos recebidos com estranhamento e certa
distância. De novo, a questão dos repertórios e da disponibilidade emergiu.
Vencida essa resistência, os seis integrantes que assistiram ao trabalho se identificaram
com a proposta: “É o nosso dilema. A gente faz de tudo, até faxina para viver
de arte”.
No salão de beleza, uma entrega
que provocou emoção na cabelereira e psicanalista Jane Camacho. No vaivém dos
afazeres, ela parecia estar distante do que acontecia ali, entre mesas de lavar
cabelos, secadores e mesinhas de manicure. Mas, ao fim, abraços e lágrimas. O
mesma carga de emoção envolveu uma secretária de um escritório de advocacia, no
Centro.
“Queria tanto essa leveza, ganhei o dia!”
“Para o bem ou para o mal,
estamos mergulhados na mesma questão”, identificou-se a produtora Camila
Martins, na Lapa.
O dia teve ainda duas entregas em
repartições públicas municipais do Centro, finalizando com uma apresentação para
Diana De Rose, gerente de dança da Secretaria Municipal de Cultura, que assistiu
ao trabalho ao lado de colegas de sala.
“Esse formato é tão rico em
termos de difusão. É essencial levar a dança a lugares fora do comum, dos
espaços onde ela é esperada. Espero que Cláudia Müller tenha ideias assim”,
comentou Diana.
Não, obrigado!
Nem todos querem receber Dança
Contemporânea em Domicílio. Ontem, no Centro, o dia começou com um não. Foi
dado por um empresário da Cinelândia, que estranhou a proposta, preocupou-se
com o que diriam seus clientes. Talvez desconhecesse as novas estratégias com
as quais a produção artística contemporânea tem buscado público. Talvez preferisse
o repertório mais tradicional de dança, do qual se avizinha, ali, no Municipal. Em uma segunda negativa, a explicação mais prática e objetiva de quem
receberia: “não tenho tempo, estou de saída”. Mas as entregas seguiram,
intensas, durante todo o dia.
quarta-feira, 24 de outubro de 2012
A dança da estratégia de sobrevivência
Na exibição do Fora de Campo,
terça-feira à noite, no Teatro Glaucio Gil, com participação da crítica Daniele
Ávila, apontamentos sobre o sentido do gesto artístico, políticas de circulação
e práticas culturais que reorganizem estas e tantas outras questões em torno da
arte contemporânea. Dessas conversas, alguns pontos:
. Essa dança em trânsito do projeto
e os jeitos de se organizar: como, ao lado de quem a favor de quais?
. A questão de entregar a dança
como um produto e também uma estratégia para implementá-la.
. A dança dos encontros, das
entregas, com um procedimento parecido como a entrega de remédios e de
alimentos = dança tão necessária como comida e alívio/saúde. A conotação e
eficácia dessa dança num contexto, nos contextos.
. Ranciére, de O Mestre
Ignorante, numa citação sobre a igualdade como princípio.
. A recepção direta do público e
a reversão/inversão dos códigos formais das danças formais.
. A formação de plateia: quais,
quantas, como, onde? Os festivais de muito público que, depois, não é fidelizado no decorrer da temporada.
. Dúvidas, dilemas, desafios.
Para conhecer mais sobre o trabalho de Daniele Ávila e uma trupe bacana que escreve sobre teatro e artes leia a revsita eletrônica Questão de Crítica: http://www.questaodecritica.com.br/
Tempero da cultura, olhos marejados
Dia cheio, dia de muitas alegrias
e certezas ontem, na Pavuna.
Alegria: chegar a um salão de
beleza pequenininho, conversar com Maria Alves, 53 anos, ou Zilma, que é seu
nome artístico, e ver a mudança do rosto dela na saída.
“É muito bom quando chega alguém
assim e entrega uma dança pra você. Aconteceu uma coisa estranha: à medida que
ela ia dançando, foi tirando o estresse do meu corpo. Foi como se o movimento
dela me aliviasse.”
Segue a caravana do Dança
Contemporânea em Domicílio, agora com parada na Escola Municipal Telêmaco
Gonçalves Maia. Quem recebe é o diretor, Marcos de Oliveira fraga, 46 anos, que
aplaude o presente.
“Em nosso país, o artista é pouco
reconhecido. Por isso, esse é um trabalho legal. E surpreendente também. A
Arena (Cultural Jovelina Pérola negra) faz um trabalho show de bola. Há uma
necessidade de as pessoas buscarem cultura”, avaliou o professor, que é vizinho
da atuante Arena Cultural Jovelina Pérola Negra.
Entrega versus entrega, eis-nos
na sede do grupo William do Gás. Antes da dança, descobrimos a ação ecológica
do empresário, que coleta óleo de cozinha para reciclagem. Na hora da dança,
ele chama seus funcionários. Plateia de seis pessoas. Olhos marejados no corpo
daqueles trabalhadores braçais. Edilson Wancok, 39, é um deles, vivendo momento
inaugural na vida:
“É primeira vez que vejo uma
apresentação tão próxima de mim. Para fazer isso tem que ter força de vontade, não?!”
Emocionado, William de Abreu, 47,
também é dos que acredita que a região é carente de arte e que, de alguma
forma, a Arena Cultural ajuda a reduzir essa carência.
“É um privilégio ter a Arena por perto.
E uma apresentação dessa pega a gente de surpresa, sou fã desse diferencial.”
Meio dia e pouco, o tempero do
restaurante Bacalhau de Tamanco ganhou tempero extra. Foi ali, entre mesas e
clientes servidos de generosos pratos de arroz, feijão, farofa, peixe frito e
outras delícias, que Cláudia Müller entregou dança para a empresária Fátima
Souza.
Na avaliação do acepipe cultural,
Fátima foi só elogios:
“Tudo que é cultura, que é levado
para a população, é bem vindo. É uma emoção, uma energia boa que dá. Depois
dessa apresentação fiquei melhor. E meus clientes aplaudiram também.”
Na casa de Zuila Goulart Amoreti,
professora aposentada de 66 anos, entrega foi no quintal. Silenciosa, ela acompanhou
tudo com atenção, elogiando o projeto no fim. O mesmo aconteceu na Escola
Wilton Garcia. Depois de duvidar do que estava acontecendo e verificar a
veracidade da entrega, a diretora Claudia Gonçalves Rezende assistiu à
apresentação na área coletiva da escola, junto com um aluno que estava de
castigo. No fim ela, comentou:
“Achei muito interessante, um
desabafo do artista quanto ao patrocínio e produção. As pessoas não vêm o lado
da arte, só o dinheiro.”
Vencendo obstáculos
Dança Contemporânea em Domicílio, em qualquer lugar, sob qualquer condições! A imagem feita por Inês Correa mostra Cláudia Müller untrapassando barreiras para entregar uma dança em bangu, segunda-feira, quando o bairro ainda contabilizava os estragos provocados pelo temporal de domingo à noite, que destelhou casas e derrubou árvores. Para visualizar melhor, clique em cima da foto!
terça-feira, 23 de outubro de 2012
Pavuna reforça certeza dessa dança
Quantos desejos, instabilidades e emoções batem à porta de
quem recebe uma Dança Contemporânea em Domicílio? É uma questão que me ocorre
agora que acabo de chegar da Pavuna, depois de várias entregas. Da professora aposentada
à criançada da aula de teatro, incluindo os dois diretores de escolas em seu
cotidiano de administração de alunos, burocracias, quadro de professores,
instabilidade de fora da área da escola, muitas questões.
Depois de Cláudia
Müller dançar, sensações afins. E a certeza da contundência do projeto. Aqui,
agora, só um relato rapidinho. Mais tarde, preparo novo post com detalhes de cada
personagem. Ah, sim: mais uma vez a certeza: a Pavuna é um lugar potente. E
muito disso é resultado da presença significativa da Arena Cultural Jovelina
Pérola Negra com seu importantíssimo trabalho de formação de plateia.
Não à toa, quando saíamos de lá, centenas de estudantes e gente da comunidade fazia fila para entrar na arena e assistir ao concerto da Orquestra Petrobrás. Demais!
Não à toa, quando saíamos de lá, centenas de estudantes e gente da comunidade fazia fila para entrar na arena e assistir ao concerto da Orquestra Petrobrás. Demais!
No supermercado, no hospital, no clube
Uma pausa nas teclas de preços para ver uma dança. Foi assim que as duas atendentes de um supermercado de Bangu receberam sua dança, encomendada por um amigo. Do estranhamento ao deleita, foram dois toques.
“Adorei. Todo o que faz parte da dança e da arte é
maravilhoso”, disse Maria Elizabete Leocádia, 49 anos.
Na hora do exame pré-natal, realizado no Centro Municipal de
Saúde Wladimyr Frango, em Bangu, a grávida Jane Teixeira, 28 anos, recebeu a
dança encomendada pelo marido Lourenço, que assistira ao videio Fora de Campo
na Lona Cultural. Ficou lisonjeada como mostra a foto acima, feita por Inês Corrêa.
Quem assistiu com ela também:
“Linda a desenvoltura, os movimentos. Tá aprovado”, disse
Lucinete Moraes de Oliveira, 60 anos.
O Pedra Branca Sport Clube estava deserto na segunda-feira à
tarde. Zidane Alves Lima, 52 anos, radialista, abriu as portas do lugar para ali,
no salão de festas, receber sua Dança Contemporânea em Domicílio. Depois da apresentação,
contou que o espaço é também ocupado pela dança de salão e pela capoeira. Acha
que a Zona Oeste precisa mais dança. Quer que o projeto volte mais para lá.
Acredita que a dança ajuda, enleva.
Uma dança para os Gregório de Bangu
Bangu contava os prejuízos e consertava suas casas nessa segunda-feira. Na Rua Tintureiro, boa parte das oitenta pessoas que moram em nova casas do número 769 estava nessa função. Crianças e adultos. E foram eles que, aos poucos, formaram a plateia da entrega de dança que Cláudia Müller fez ali mesmo, na entrada da espécie de vila improvisada. Seis, oito, dez, catorze pessoas assistiram ao trabalho. Encantadas, entre risos dos pequenos e olhares atentos dos adultos, a turma da família Gregório aplaudiu no fim. E sentiu-se pra lá de importante e aliviada num dia tão desafiador.
Luiziana Gregório, 25 anos, três filhos, assim se manifestou
sobre o que vi:
“Isso traz tranquilidade, calma, paz. Gosto de teatro, de
dança. Queria botar minhas filhas na dança. Só não vou mais ao teatro porque
não tenho dinheiro. Isso realmente transmite paz pra gente. E o interessante é
que ela veio aqui trazer.”
Na hora da despedida, Luiziana, uma das mais falantes integrantes da família Gregório deu seu veredito para a ação:
“Isso é cultura!”
Para ver melhor a foto de Inês Corrêa, clique sobre ela.
Para ver melhor a foto de Inês Corrêa, clique sobre ela.
Hoje tem função na Pavuna e no Leme
Programa duplo do Dança Contemporânea
em Domicílio nesta terça-feira: pela manhã e à tarde, entregas de dança na
Pavuna. À noite, às 21h, no Teatro Glaucio Gil, exibição do vídeo Fora de Campo,
com debate com a diretora e crítica Daniele Ávila. A entrada é franca. A
exibição da produção co-dirigida por Cláudia Müller e Valeria Valenzuela serve de “start” para os pedidos de entrega
em Copacabana e no Leme, que serão dias 27 e 29. O fone é: 93007896.
segunda-feira, 22 de outubro de 2012
Isto não é um texto
Inês Corrêa chegou! Fomos a Bangu, entregamos dança, ela fotografou, eu devo ainda fazer um post. O blog deve começar a ter imagens! Mas, inspiradora foi a conversa no fim da tarde, em Ipanema, "limpos" pelas águas de Iemanjá. Falamos sobre o que é fotojornalismo, foto publicitária, foto para dança, foco de trabalho e dos estudos dela. Daí que, como a partir de agora teremos fotos postadas e provocado por ela, arrisco-me a postar as fotos abaixo. Espero que os leitores consigam ver as imagens que descrevo. Só para quem não sabe: ao entregar danças, Cláudia Müller usa figurino laranja e lilás.
Foto 1
O casal se ajeita na rua estreita,
ela ocupa uma cadeira, que vira sua arquibancada. Na casa ao lado, no portão,
mãos penduradas, uma senhora negra de cabelos brancos, sem vários dos dentes da
frente pita algo como um cigarro, na outra casa, da laje, um rapaz olha para baixo.
Três meninos passam correndo, estourando estalinhos. Diante desse quadro, um
borrão lilás-alaranjado se move.
Foto 2
Há uma mureta, seis pessoas
sentadas nela. Cinco mulheres, um travesti. Ele ri, melhor, ele sorri. Atrás
deles, mais gente. Barulho das motocicletas intermitentes das ruas da Maré. No
outro lado da rua, pagode tocando solto na máquina de música. Numa das mesas,
quatro rapazes bebem uísque e mordiscam algo. Na outra mesa, recém-ocupada,
dois rapazes tatuados e uma negra charmosa servem cerveja gelada. Entre os dois
grupos, um borrão lilás-alaranjado se move.
Foto 3
É quase noite, as ruas da Maré
ficam mais escuras. Mesmo na transição da tarde para a noite, as crianças
seguem soltas. Numa que outra esquina, o comércio endola. Não há muita
preocupação por quem passa. No meio do quarteirão, num boteco, o
trio de rapazes divide cervejas. Um deles acena ao ver uma mancha tripla lilás-alaranjada cruzando.
Hoje tem entregas em Bangu
Dia de voltar a Bangu! Daqui a
pouco, a van do projeto Dança Contemporânea em Domicílio parte da Casa da
Glória rumo ao bairro, para as entregas. E hoje tem a companhia bacana de Inês
Corrêa, fotógrafa que vai registrar esse processo todo em imagens! Para amanhã,
entregas na Pavuna! Pedidos pelo fone: 93007896.
A poesia possível numa entrega de dança
“Que tipo de poesia você faz?”
Essa foi a pergunta do garoto Renato Habib Costa, 12 anos, assim que assistiu à
exibição de Fora de Campo, sábado, às 15h, no Parque das Ruínas, em Santa
Teresa. Cláudia Müller explicou que a citação sobre poesia, feita numa fala
anterior, se referia a um estudante de 16 anos da Pavuna, que lhe perguntara
sobre método de criação, revelando que faz teatro e tenta escrever poesias.
Fiquei particularmente feliz com a pergunta. Num dos trechos da exibição do vídeo, uma das falas é de que “a poesia está no entre...”. Falam o menino e a senhora, sobre uma poética que, mesmo não explicita, pulsa em Dança Contemporânea em Domicílio. Ela diz respeito ao encontro, à confiança no diálogo, à partilha de desejos e esperança, à aposta nas relações. Brinquei com o garoto dizendo que Cláudia faz, sim, poesia. São versos sobre amizade, urgência, toque, afetos, diálogos, delicadezas, solidão, urgências.
A forma como as entregas emocionam o público é pura poesia. Provocam emoção, acionam lembranças, atiçam desejos e sonhos. Feliz por ter pedido uma dança para seu cabeleireiro, Neilde Barcelos, 51 anos, auxiliar administrativo, moradora da Maré, disse que uma entrega como a proporcionada pelo projeto “é pura alegria”. E continuou:
“Nem todo mundo sabe o que dança contemporânea. Poderia ter mais pessoas para levar dança em qualquer lugar, sem barreiras. Vir a um a comunidade como a Maré foi bacana demais.”
Esse trânsito entre o conceito e a estética, numa ação potente de significados, aciona outros tantos “entres” de Dança Contemporânea em Domicílio. Entre o arrojo e a simplicidade, entre o discurso e a prática, entre a vontade de tocar pela delicadeza e a necessidade de ser agressivamente significativa. Cada movimento, cada fala, cada verso, cada poesia. Afinal, o corpo contemporâneo é o somatório disso tudo e mais.
Fiquei particularmente feliz com a pergunta. Num dos trechos da exibição do vídeo, uma das falas é de que “a poesia está no entre...”. Falam o menino e a senhora, sobre uma poética que, mesmo não explicita, pulsa em Dança Contemporânea em Domicílio. Ela diz respeito ao encontro, à confiança no diálogo, à partilha de desejos e esperança, à aposta nas relações. Brinquei com o garoto dizendo que Cláudia faz, sim, poesia. São versos sobre amizade, urgência, toque, afetos, diálogos, delicadezas, solidão, urgências.
A forma como as entregas emocionam o público é pura poesia. Provocam emoção, acionam lembranças, atiçam desejos e sonhos. Feliz por ter pedido uma dança para seu cabeleireiro, Neilde Barcelos, 51 anos, auxiliar administrativo, moradora da Maré, disse que uma entrega como a proporcionada pelo projeto “é pura alegria”. E continuou:
“Nem todo mundo sabe o que dança contemporânea. Poderia ter mais pessoas para levar dança em qualquer lugar, sem barreiras. Vir a um a comunidade como a Maré foi bacana demais.”
Esse trânsito entre o conceito e a estética, numa ação potente de significados, aciona outros tantos “entres” de Dança Contemporânea em Domicílio. Entre o arrojo e a simplicidade, entre o discurso e a prática, entre a vontade de tocar pela delicadeza e a necessidade de ser agressivamente significativa. Cada movimento, cada fala, cada verso, cada poesia. Afinal, o corpo contemporâneo é o somatório disso tudo e mais.
domingo, 21 de outubro de 2012
Olhar fotográfico para a dança
Inês Corrêa é pesquisadora e fotojornalista, mestranda em
Comunicação e Semiótica pela PUC de São Paulo. Foi fotógrafa colaboradora da
Folha de S Paulo e Folha da Tarde e produtora executiva do programa sobre
desenvolvimento sustentável Espaço do Litoral, TV Cultura - Litoral. É repórter
fotográfica da agência P.A.P.A – Participating Artists Press Agency, sediada em
Amsterdã - Holanda, coordenada por Lino Hellings, socióloga. Começou a
fotografar teatro e dança no Teatro Coletivo, antigo Teatro Fábrica e realiza
trabalhos profissionais para Cia. Taanteatro; Keyzetta e Cia.; Ângelo Madureira
e Ana Catarina Vieira Cia. de Dança, Cia. Borelli de Dança, Cia. Flutuante,
Grupo Gestus, Cristian Duarte, Emilie Sugai, Júlia Rocha, Gícia Amorim, Eduardo
Fukushima, Diogo Granato, Raul Rachou e Helena Bastos entre outros. Também é Membro
do CED - Centro de Estudos em Dança (PUC/SP). Neste domingo, Inês chega se
junta ao Projeto Dança Contemporânea em Domicílio para registros das entregas
que estão sendo feitas por 15 bairros cariocas. Aqui, um papo com a
profissional sobre as nuances de seu trabalho, que tem focado a dança com
significativa propriedade.
- Qual a
especificidade da fotografia de dança, o que ela exige do profissional?
A fotografia de
dança, como a fotografia de qualquer coisa – gastronomia, turismo, natureza,
política, guerra –, tem sim sua especificidade, Carlinhos. Vou começar a
responder sua pergunta refletindo primeiro sobre como buscar esta
especificidade. Penso que para encontrá-la o que é exigido de um profissional
antes de qualquer coisa, é envolvimento, ou seja, o fotógrafo fotografa aquilo
que afeta sua percepção. Mas como se envolver sem se apaixonar para um contato
mais próximo, mais íntimo? Porque escolheria a dança para meu fazer fotográfico
se gostasse mais de futebol ou de guerra? Esta escolha do fazer o que se gosta
pode ajudar, e muito, no encontro das especificidades desta fotografia, desta
escrita da luz do movimento. Para que aconteça um encontro mútuo:
fotografia-dança, dança-fotografia. Um querer se encontrar. Escolher a dança
para criar uma imagem é se deparar com o corpo em movimento contínuo no
espaçotempo.
- Na tua proposta
em especial, o que interessa na hora de fazer uma foto/ensaio?
Existem muitas
pesquisas diferentes acontecendo na dança. Um universo que vem em direção da
fotografia. Como sou jornalista, como você Carlinhos, imagino que o que me
interessa é a diversidade dela, da dança. Sou curiosa, quero conhecer, muitas,
se puder todas as propostas que acontecem em dança hoje. Na hora da foto o
interesse pode mudar. Dependendo do que tenho para fotografar. Não consigo
pensar num único olhar fotográfico para propostas tão distintas. Perceber as
diferentes propostas e “traduzi-las” em imagem fotográfica depende de muitas
escolhas que acontecem na hora da foto. Não há um manual de instrução, há um
querer ver aquele objeto em memória, querer criar uma memória da dança
utilizando-se da fotografia.
- Por que a dança
te atrai profissionalmente?
Sempre digo,
Carlinhos, que a dança mudou meu olhar, meu fazer fotográfico. Olhar a dança e
torná-la imagem fotográfica é algo que me inquieta. Ao fotografar começo pela
luz, afinal, fotografia quer dizer grafia da luz. Depois a dança me capta pelo
movimento do corpo e, consequentemente o tempo fotográfico deste corpo. Olhar a
dança hoje, estas danças que acontecem atualmente, para mim, é ter contato com
o tempo de agora para guardar a memória deste tempo, deste corpo que se expõe
em dança, em movimento. É fazer deste fato um acontecimento.
- O que te mobiliza
em especial nesse projeto Dança Contemporânea em Domicílio?
Fotografo dança
somente desde 2007 e, quando a Cláudia Müller entrou em contato comigo e propôs
que eu fotografasse o Dança Contemporânea em Domicílio foi uma honra
porque o trabalho que ela sugere é inusitado. Por outro lado, ficou muito claro
para mim o que falei logo acima, sobre o gostar do que se faz e quanto isso nos
leva ao encontro, neste caso dança-fotografia, proporcionado pela Cláudia ao me
escolher para fotografar seu projeto e fotografia-dança, que será a forma como
vou expressar em imagem o Dança Contemporânea em Domicílio.
- Como você
acompanha a cena da dança brasileira, o que pensa sobre ela?
Bom, Carlinhos, não
vejo uma cena da dança brasileira. Vejo muitas cenas. E é isso que me faz
querer mais e mais fotografar dança. Porém não sou a pessoa mais indicada para
falar sobre dança. Existem profissionais especializados. Mas posso falar sobre
a fotografia de dança que pode tornar visível esta cena ou aquela, fazer uma cena
sair de um domicílio e entrar em outro em forma de imagem, deslocar o palco
para o papel, para a internet.
- Você está com um projeto específico? Qual?
Estou preparando
uma dissertação de mestrado na PUC-SP e meu objeto de estudo é a fotografia de
dança e como ela pode contribuir para uma reflexão sobre o papel da fotografia
jornalística com recorte no jornalismo cultural. Ou seja, neste projeto a ideia
é propor uma reformulação dos critérios de publicação das fotografias
jornalísticas no campo do jornalismo cultural.
Para acompanhar
outros trabalhos de Inês Corrêa, seguem dois links bacanas, do site e do blog
que ela mantém:
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